sábado, 26 de fevereiro de 2011

Extraordinário Lixo Imaginário



Estamos à beira da premiação do Oscar. E como bons colonizados cultuaremos, como em todos os anos, o modo de vida superior, a raça dos afortunados, dos que consomem 70% dos recursos disponíveis, transformando e devolvendo sua matéria não reciclável nas redes e telas de todo o planeta. Mais de 80% do mercado audiovisual concentra-se nas mãos de um oligopólio que age com o poder e o aval do Estado mais poderoso do mundo. O extraordinário lixo imaginário que vem de lá transforma-se em lixo real, com latas e pets de Coca-Cola e caixas de McDonalds.
O Oscar deste ano tem um gostinho especial para os brasileiros. Lixo Extraordinário, que retrata o processo criativo do artista Vik Muniz no maior aterro sanitário do mundo, o lixão de Jardim Gramacho, no Rio, concorre na categoria de melhor documentário. Apesar de bancado com dinheiro (público?) brasileiro, quem contabiliza a indicação é o Reino Unido. O Brasil faz-se representado na mais concorrida cerimônia do mundo das celebridades, não só por Vik, mas também pelo catador Sebastião Carlos dos Santos, o Tião.
O carvão que move a locomotiva do consumo continua sendo a indústria audiovisual global, que se camufla onipresentemente por TVs, computadores, celulares, videogames portáteis e telas em lares, ônibus, metrô, praça pública, bares e restaurantes, pelas bibocas mais longínquas do planeta. Para a indústria do entretenimento tudo é descartável e vira lixo no momento seguinte, quando sai de cena. E quando sai de cena, deixa de existir no mundo maravilhoso da mídia. Mas não da nossa vida real.
O lixo toma conta e denuncia uma sociedade doente, como prenunciava Wall-E, ganhador de Oscar de melhor animação de 2009, enquanto os humanos, distraídos por telas portáteis em um cruzeiro de entretenimento intergalático, são salvos por um simpático robô que comprime e recicla os dejetos humanos, apaixonado por uma sonda em busca de qualquer sinal de natureza na Terra.
Tião é o novo anti-herói brasileiro, devorado pelos abutres da grande imprensa. Se ganhar o Oscar vai parar no Faustão, Gugu, Big Brother, estampará as páginas internas de Caras e a capa da Veja. E voltará ao lixão, como no excelente “A pessoa é para o que nasce”, de Roberto Berliner.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Cultura: do Pensamento para o Entretenimento

                                                          http://bit.ly/go8rS9

Será que a produção cultural se resume em fornecer mercadorias
a um supermercado de entretenimentos?


Publicado originalmente em 30/08/2008

Nada mais desprezível e repetitivo do que certas falas sobre cultura que jorram nos congressos, seminários, na mídia, hoje em dia. A impressão é que houve uma perda da capacidade de produzir pensamento e a ausência de platéias seduzidas pela reflexão. Não se interroga a produção simbólica, faz-se reivindicações, relatos, comentários para animar um auditório acostumado ao olhar da televisão. Se algum dia na história, o filósofo, o intelectual, o crítico, o artista, o poeta ocupavam o lugar privilegiado de formar opinião, hoje, esse lugar é ocupado pelo produtor, o empresário cultural, o profissional de marketing. E a cultura é vista apenas como um agente de estímulo da economia de uma sociedade em declínio.

O discurso fica na superficialidade. Que a cultura é um bem de consumo, ninguém duvida, gera emprego, garante retornos significativos para a economia de uma cidade. Mas os profissionais do marketing, os políticos e os empresários ignoram na cultura a sua lógica: a do sentido, que ela é uma dimensão da existência do homem. “O que chamamos ‘cultura’, portanto é a ciência e a consciência com que o homem ocupa o espaço e o tempo de sua morada histórica. E o homem culto é aquele que cultiva essa ciência e essa consciência.” (Gerardo Mello Mourão). A cultura é um conjunto de práticas por onde transitam uma autonomia, a experiência de uma saber e uma política específica. O patrocínio que substituiu o antigo mecenato reduziu os problemas da cultura às leis da economia e o poder do patrocinador acabou decidindo sobre padrões estéticos ou linguagens. Há uma valorização arbitrária de um produto cultural em detrimento de outro e a divulgação fica submetida a um jogo de poder de quem manipula direta ou indiretamente com os mídias e o mercado.

Somente com talento e invenção é difícil competir no mercado. Os profissionais que ganharam celebridade através do marketing cultural animam o espetáculo que faz da cultura um supermercado de entretenimentos. “Nos meios de comunicação, a confusão que se estabelece entre o princípio tradicional de celebridade baseado nas obras, e o princípio midiático baseado na visibilidade da mídia é cada vez maior.” (Pierre Bourdieu). A cultura passa a ser apenas o que ela representa no campo da economia e da diversão. Enquanto se discute as leis de incentivo a cultura não se discute a idéia de cultura  e as instituições culturais não cumprem o papel de difundir um princípio de cidadania cultural. Uma política cultural indecisa, calcada em princípios poucos profissionais que desprezam ou desconhecem o fazer e suas materialidades específicas. E sem trabalhos, sem críticas, sem um suporte que sustente a formação e a divulgação da informação não vamos construir nenhuma credibilidade cultural. “A arte age e continuará a agir sobre nós enquanto houver obras de arte” (Merleau-Ponty). E não discursos sobre as obras.

Uma cidade, um Estado, um País passam a ter uma existência cultural e conquistam um reconhecimento no futuro quando aprendem a respeitar seus artistas e intelectuais, quando aprendem a conviver e garantir as disparidades culturais. Entendemos que as instituições culturais como; fundações, universidades, museus, etc. têm um papel importante a cumprir na produção e divulgação da informação dos produtos artísticos acima de compromissos pessoais e políticos que ignoram a   natureza da linguagens artísticas. “No curso de grandes períodos históricos, juntamente com o modo de existência das comunidades humanas, modifica-se também seu modo de existir e perceber” (Walter Benjamin).  A produção cultural participa dessas mudanças com a tarefa de transformar a realidade dentro de um território determinado da sociedade e do pensar onde a cultura age.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Professores Digitais



Quando encontra dificuldade para ajudar o filho na lição de casa, Bill Gates aciona o professor Salman Khan. "Tudo fica fácil", diz Gates, que, nos últimos anos, vem gastando dezenas de milhões de dólares em sua fundação para descobrir novos jeitos de educar.

Filho de família da Índia e de Bangladesh, Khan tem um currículo capaz de impressionar qualquer gênio: no MIT (Instituto Tecnológico de Massachusetts), fez matemática, engenharia elétrica e ciência da computação; em Harvard, administração. Mas o que impressiona mesmo Gates é o valor das aulas: são de graça e acessíveis a qualquer um - aliás, neste momento, se quiser, você também pode entrar na internet e receber as mesmas aulas.

Khan foi um dos personagens que influenciaram Gates a escrever um texto em que sugere a substituição dos professores convencionais por aulas, acompanhadas de exercícios, gravadas com recursos multimeios por professores como Khan e distribuídas para todos. "É melhor uma boa aula desse tipo do que as dadas por professores medíocres", provoca o criador da Microsoft.


Muita gente está levando a sério a possibilidade de as novas tecnologias exterminarem o professor como o conhecemos. Haveria uma radicalização do ensino a distância. Já há recursos para que um curso seja dado sem interferência humana. As aulas são gravadas e todos os debates, exercícios e notas são feitos por um programa de computador.


Autor da ideia de um computador por criança, Nicholas Negroponte me disse que está preparando uma experiência para ser lançada em comunidades da África e da Ásia que têm alto índice de analfabetismo. Quer deixar num lugar público computadores conectados à internet para ver como e se as crianças conseguem aprender a ler e a escrever sozinhas. "Cada vez mais o conhecimento vai ser transmitido fora da sala de aula", comentou.


Esse tipo de recurso pode ajudar muito os alunos, especialmente os mais pobres, mas duvido que possa atingir a excelência sem que se viva num ambiente criativo, estimulante, com trocas entre alunos e professores motivados. Qualquer um pode acessar aulas do MIT ou de Harvard, entre outros grandes centros de ensino. Outra coisa é entrar num laboratório e acompanhar, por exemplo, o nascimento de um carro capaz de estacionar sozinho. Esse projeto é desenvolvido no AgeLab, que se dedica a criar produtos e serviços para idosos. Já está criando roupas e acessórios para os mais velhos evitarem acidentes.

Estou aqui em Harvard experimentando uma poderosa combinação do virtual com o presencial, num curso sobre experiências educativas internacionais. Cada aula se transforma num fórum na internet entre os estudantes, conduzido por três monitores. Daí surgem outros fóruns autônomos para cada comentário. Para aprofundar as questões, a classe, separada em três grupos, reúne-se presencialmente.

O professor mistura as aulas expositivas com depoimentos de convidados do mundo inteiro, que, a distância, ilustram os textos curriculares. Um explica como usa a tecnologia para melhorar o ensino em áreas rurais da Índia, outro conta como cria bibliotecas em remotas vilas da Ásia ou da África. Depois da exposição, os convidados respondem às questões dos estudantes. Tudo é gravado e postado na rede.

Tecnologia alguma, porém, supera o entusiasmo de um professor como Fernando Reimers. Ele viaja pelo mundo para conhecer experiências educacionais e participa de algumas delas. Não há software capaz de competir com essa paixão.

O que veio para ficar foi o fato de as informações circularem, criando a possibilidade de que o mundo se converta numa imensa comunidade de aprendizagem. Existem sinais por todos os lados.

Um dos negócios que prosperam no mundo digital são páginas abertas a perguntas que são respondidas por leitores. A diferença agora é que empresas estão contratando especialistas para dar respostas quase imediatamente. Há redes sociais em que se podem aprender todas as línguas importantes. Em outras páginas, são ensinadas expressões e gírias que acabam de surgir. Aprende-se espanhol com alguém que está na Argentina ou na China.

O que vai mudar é que o professor que despeja automaticamente os conteúdos será mesmo dispensável, pois será mais caro e menos eficiente do que uma tela de computador.


Retorno II



Saudações.
Tempo, escasso e precioso "bem".
Produzir textos pertinentes para postagens tendo longa e diversificada jornada profissional é um exercício de extrema organização e disciplina.
Quem sabe reproduzindo, registrando, difundindo, ideias, conceitos, propostas, informações já formatadas em coerentes exposições seja uma forma útil de compartilhar esse espaço virtual de forma mais frequente?
Veremos.